A Revolução de 1820 muda a História de Portugal

Ma manhã de 24 de Agosto de 1820, o coronel Sebastião Drago Cabreira (1763-1833) montou a cavalo e passou revista aos homens do Re­gimento de Artilharia nº 4, formados no Campo de Santo Ovídio, no Porto.

Terminada a revista, mandou ler uma proclamação.

Os soldados souberam então que tinham pega­do em armas pela "salvação da Pátria" e para exigir a formação de um governo que convocasse cor­tes para dar a Portugal uma Consti­tuição "cuja falta é a origem de todos os males".

Gritaram vivas ao rei, à Constituição, à dinastia de Bragança e à "Santa Religião"

e foi celebrada missa campal.

O coronel Cabreira não sabia que estava a dar início à mudança mais radical na sociedade portuguesa em sete séculos de monarquia.

O pronunciamento militar do Porto marcou o fim do Antigo Regime, em que o rei tinha o poder absoluto por direito divino, e abriu caminho para o regime constitucional, com sepa­ração de poderes, governo repre­sentativo e igualdade perante a lei.

 

A Revolução Liberal, che­fiada, além de Cabreira, pelo coro­nel Bernardo Sepúlveda, pelo brigadeiro António da Silveira e pelo mare­chal de campo Gaspar Teixeira, vinha a ser preparada desde há dois anos.

Em 1818, os juristas Manuel Fernandes Tomás e José da Silva Carva­lho organizaram no Porto uma associação secreta a que chamaram Sinédrio, cujo objectivo era a "regeneração da Pátria".

A ocupação francesa, em 1807­-1808, e o domínio exercido depois pelos britânicos colocou o país nas mãos do general Beresford, todo­-poderoso junto do governo nomea­do por D. João VI a partir do lon­gínquo Brasil. Além de quererem dar remédio à miséria do povo e ao descalabro da economia, os liberais estavam animados de um sentimento anti-inglês e que­riam o regresso do rei, inconforma­dos com a situação de Portugal, há uma dúzia de anos reduzido a "colónia de uma colónia".

Quando o general Riego encabe­çou uma revolução liberal em Espanha, em Janeiro de 1820, Fernandes Tomás e os membros do Sinédrio decidiram que a situa­ção estava madura para um golpe de força.

Logo a seguir ao pro­nunciamento no Campo de Santo Ovídio, os insurrectos do Porto formaram uma Jun­ta de Governo, presidida pelo brigadeiro Silveira e in­tegrada sobretudo por juris­tas e comerciantes, com re­presentantes da nobreza e

do clero, incluindo Frei Fran­cisco de S. Luís, reitor da Universidade de Coimbra.

Em Lisboa, os regentes co­meçaram por tentar resistir aos "rebeldes" mas, a 15 de Setembro, o tenente Aurélio José de Morais saiu do quartel de Campo de Ouri­que à frente do Regimento de Infantaria 16 e marchou para o Rossio aos vivas à

Junta do Porto. A regência caiu e, a 1 de Outubro, tomou posse a Jun­ta Provisional do Governo Supre­mo do Reino.

Uma das primeiras medidas foi proibir o desembarque de Beresford, que voltava do Brasil. Outra foi a convocação de eleições para as Cortes.

A 11 de Novembro, dia de S. Martinho, deu-se uma tentativa de golpe que ficou conhecida pela Martinhada. Um grupo de militares radicais chefiados por Gaspar Teixeira (que mais tarde aderiu à causa miguelista) quis afastar do governo Fernandes Tomás, mas perdeu a parada.

 

Realizadas as eleições, em Janeiro de 1821, o primeiro Parlamento português reuniu-se no Convento das Necessidades. As Cortes produziram legislação que trouxe o país para os tempos modernos – abolição dos tribunais da Inquisição e da Inconfidência, amnistia dos presos políticos, liber­dade de imprensa, criação do Ban­co de Lisboa, entre outras medidas. A Constituição foi aprovada em Setembro de 1822.

Antes disso, em Julho de 1821, D. João VI tinha regressado do Brasil. O rei jurou a Constituição e aceitou o novo regime. Mas, em 1823, o golpe contra-revolucioná­rio da Vilafrancada, chefiado por D. Miguel, suspendeu o processo de instauração do liberalismo em Portugal.

O sistema constitucional só foi estabelecido definitivamente depois da guerra civil, em 1834.

 

 

(J. Ferreira – NS)