ARISTIDES DE SOUSA MENDES

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No memorial Yad Vashem, às vitimas do Holocausto, em Jerusalém, há uma árvore com um nome português. Esse nome é o de Aristides de Sousa Mendes, a quem já chamaram "o Schindler português", por comparação com outro herói da humanidade que se tomou famoso graças ao filme “A Lista de Schindler”. Mendes também teve a sua lista: salvou de morte certa 30 mil perseguidos pelos nazis. Para isso desobede­ceu a ordens directas de Salazar e arruinou uma brilhante carreira de diplomata. Foi demitido por te­legrama, a 23 de Junho de 1940.

Aristides de Sousa Mendes do Amara! e Abranches nasceu em 19 de Julho de 1885, em Cabanas de Viriato, Viseu. Licenciou-se em Direito na Universidade de Coim­bra, em 1907, e seguiu a carreira diplomática. No ano seguinte, ca­sou-se com uma prima, Angelina, com quem teve 14 filhos.

Católico, monárquico e conservador, não se deu bem com a I República. O gol­pe de 28 de Maio de 1926 trouxe-lhe vantagens. Em 1932, Salazar tornou-se presidente do Conselho de Ministros e nomeou para a pasta dos Negócios Estrangeiros o seu irmão gémeo César de Sousa Mendes, que ocupou o cargo apenas nove meses. Cônsul em Bordéus, Aristides assistiu ali ao início da II Guerra Mundial.

Prevendo um afluxo de refugiados a Portugal, neutro no conflito, Salazar (que entretanto acumulara a pasta dos Estrangei­ros) enviou ao corpo diplomático novas regras para a concessão de vistos. Foi a Circular nº 14, de Novembro de 1939. O documen­to proibia os cônsules de conce­derem passaportes ou vistos a "estrangeiros de nacionalidade indefinida, contestada ou em litígio", apátridas e judeus, "quer tenham sido expulsos do seu país de origem ou do país de onde são cidadãos".

 

Perante a ofensiva irresistível da Blitzkrieg alemã, em Junho de 1940, o Governo francês abandonou Paris e fez de Bordéus a capital. Tropas em retirada e civis em pânico rumaram ao Sul pelas estradas apinhadas. À chegada a Bordéus, milhares de refugiados procuravam imediatamente o Consulado de Portugal. Um visto para Lisboa abria as portas para a liberdade.

Para obedecer às ordens, Sousa Mendes teria de pedir autorização, por escrito, caso a caso. No dia 16 de Junho de 1940, um domingo, Sousa Mendes viu a cidade a rebentar pelas costuras com a vaga de refugiados – e tomou uma deci­são. Daí em diante não olharia mais a nacionalidades, raças ou religiões. Daria vistos a todos quantos lhos pedissem.

Ele sabia aquilo de que os nazis eram capazes e estava disposto a sacrificar a sua obediência de funcionário – logo, a carreira, para evitar a morte de inocentes. Passou os dias seguintes a assi­nar vistos, sem cobrar taxa. Entre os que entraram em Portugal com visto assinado por Sousa Mendes contam-se o filho do último impe­rador austríaco, arquiduque Otão de Habsburgo, e o actor norte-americano Robert Montgo­mery. A 23 de Junho, informado do que se passava, Salazar tele­grafou para Bordéus comunicando a demissão de Sousa Mendes.

A desobediência foi conside­rada uma afronta intolerável pelo ditador. Decidiu fazer de Sousa Mendes um exemplo para a admi­nistração pública em geral e o corpo diplomático em particular. Instaurado um processo discipli­nar, o ex-cônsul foi condenado a "um ano de inactividade com direito a metade do vencimento da categoria, devendo em segui­da ser aposentado".

Reformado aos 55 anos, sem direito a exercer a profissão de advogado, nem sequer licença de condução (a carta, obtida no estrangeiro, foi-lhe retirada), Sousa Mendes, ainda com muitos filhos a cargo, afundou-se. Ameaçado pela fome, aceitou o apoio da Comunidade Israelita de Lisboa, incluindo a oferta de refeições. Foi a comunidade judaica que facilitou a emigração de alguns dos seus filhos para os Estados Unidos.

A 3 de Abril de 1954, Aristides de Sousa Mendes morreu no Hospital da Ordem Terceira de S. Francis­co, em Lisboa, de uma trombose agravada por uma pneumonia, na mais negra miséria.

 

 

O motivo que levou Aristides de Sousa Mendes a desobedecer a Salazar perma­neceu um mistério durante décadas. Uma carta da historia­dora Margarida de Magalhães Ramalho, publicada no semaná­rio Expresso de 9 de Julho de 2005, veio ajudar a esclarecê-lo.

A carta reproduz, a pedido do filho do cônsul, Pedro de Sousa Mendes – falecido dias antes, a 28 de Junho de 2005 -, a frase exacta que Aristides proferiu quando, "após três dias deitado na cama", se decidiu a "ganhar a honra" e desobedecer às or­dens do ditador: "Ouvi uma voz que me disse que me levantas­se e fosse dar vistos a todos os que precisassem."

Pedro de Sousa Mendes tinha 20 anos quando, na manhã de 16 de Junho de 1940, viu o pai come­çar a passar vistos aos refugia­dos para Portugal até as mãos lhe doerem.

 

(J. Ferreira in NS)

 

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Uma resposta a ARISTIDES DE SOUSA MENDES

  1. Alpha diz:

    Mais uma de suas excelentes postagens de cunho histórico, meu amigo Mário! Que bom estar aqui…Que grande e nobre homem esse Sr. Aristides… não lhe conhecia a história.Um grande abraço, meu amigo!

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